A VOZ DO SILÊNCIO NOS POEMAS DE CONCEIÇÃO CRISTÓVÃO

O poeta inverteu a ordem da heurística: Será vã a tentativa
de procurar o conteúdo dos poemas nas palavras de que se
compõem os versos?
A significação dos poemas de Conceição Cristóvão está
alojada no silêncio?
Visto por Roland Barthes1 como linguagem, o silêncio engendra o prazer do texto (usufruído pelo leitor). Desempenha, porconsequência, uma função hermenêutica do escrito lírico.

Max Picard2, em Monde du Silence (PUF), deixou-nos um instrumento para a reflexão sobre o silêncio na ficção literária.

Com o filósofo suíço-alemão, a substância do escrito ficcional desaparece se a palavra renuncia à sua relação com o silêncio, pois equivaleria à extinção do ser humano (cuja existência se estrutura em silêncio).

A origem alemã de Max Picard permite apreender a dupla perspectiva do silêncio: o visível, o de calar (schweigen) e o mental (stille).
A arte em geral, poesia incluída, emerge do silêncio e as obras artísticas expõem-se em silêncio.

No poema “poesia: garças & voos inteligentes da alma” (livro I Vozes e silêncios no rumor da palavra), Cristóvão aponta o lugar ideal para o cultivo da arte poética: “lá fora: garças / cá dentro: graças”. Fá-lo à guisa de aceitação da proposta de Max Picard, o qual exprime aversão à apetência pelo imediato, à desordem e ao ruído da publicidade (infelizmente, tais se instituem como norma entre nós). Já Fernando Pessoa3 equiparava a fama (excessiva exposição) à nudez em público. Picard preferiu confinar-se nas colinas banhadas pelo rio Tissen (Suíça). Entendeu ser a natureza,
porque isenta de fragor, o remédio para as agruras da vida.
O alvoroço da publicidade deve ser confiada às garças, cuja
actividade eliminará as cigarrinhas-das-pastagens (analogia aos
escrevinhadores apressados), protegendo, assim, as gramíneas,
salvando o porvir (alusão metafórica à qualidade da poesia).

CONCEIÇÃO CRISTÓVÃO, ou Conceição Luís Cristóvão, de seu nome
completo, também conhecido pelos mais íntimos como São Cristóvão, nasceu na Aldeia de Kaseku Seku, em Malanje, aos 4 de Junho de 1962.

É Engenheiro de profissão, professor e gestor. Em 1983, fundou no Huambo, com mais outros jovens e no calor do movimento brigadista, a Brigada Jovem de Literatura “Alda Lara”, de onde emergiram nomes como João Maimona, João Tala, Kudijimbe, para além de outros menos
conhecidos, como Aldino Remy Sachambula, Mabell Neto, Júlio Graça, Amaro Tati, Futi, etc.

A 22 de Novembro de 1987, na I Conferência Nacional Constitutiva da Brigada Jovem de Literatura de Angola (BJLA), realizada no então
Palácio de Congressos, em Luanda foi eleito seu primeiro Secretário Geral.
Membro da União dos Escritores Angolanos, São Cristóvão é poeta, cronista, ensaísta, crítico literário e conferencista, tendo publicado os livros A Voz dos Passos Silenciosos (Poesia, 1990), Amores Elípticos (Poesia, 1996), Idade Digital do Verso (Poesia, 2002), Pela Porta da Palavra (Crónicas e Ensaios, 2003), SolSalSeioSexo (poesia, 2006), para além de inúmeros textos (poemas, contos, ensaios, etc.) em antologias, revistas e jornais de especialidade.

SILÊNCIOS NA FÍMBRIA DA VOZ | …falam das perdas | das pedras | às pedras é o seu primeiro livro publicado pela Mayamba.